O LIVRO de Bárbara #04

Quarta-feira, 24 de junho de 2009


O feriado de São João começou na segunda-feira. Imagino como vai ser difícil e chato ficar quase quinze dias sem ter alguém pra conversar. Eu tenho de hoje a 6 de julho pra não fazer nada.

Hoje Lilian veio jantar aqui em casa. Estive pensando se ela não tem algum tipo de patologia psíquica. Sei lá, ela falou uma coisa muito estranha durante o jantar. Meu pai e ela estavam conversando sobre criar filhos e ciúmes do crescimento deles. Claro que meu pai não tem nenhum problema comigo. Eu sou anti-social. Ele não disse isso, mas provavelmente pensou. Só falou “Ela não me dá muito trabalho”. Agora, a namorada dele disse que, se um dia o filho dela se interessar por alguma menina e depois quiser casar com ela, ela vai trancá-lo em casa. Pra ser mais exata, ela disse o seguinte: “Tranco ele em casa, depois mato a garota. Ninguém vai roubar meu filho de mim”. O clima ficou tenso. Ela sorriu, disse que era brincadeira, mas eu nunca vou esquecer como os olhos dela brilharam quando ela falou na morte da possível nora. Deu pra entender porque João Lucas é tão mimado.

Mas eu fiquei preocupada. Se ela for mesmo tão ciumenta, como ela vai viver em paz com meu pai? Que eu observe, ele é um coroa bem enxuto, que chama atenção das mulheres. Já imaginou se eles estão juntos na rua, uma mulher olha pra meu pai, Lilian saca uma arma da bolsa e atira na moça? Penso nela dizendo “Vou te trancar em casa Paulo. Ninguém vai roubar meu namorado”. Espero que esse ciúme dela não se transfira pra mim.


Sexta-feira, 26 de junho de 2009

Estou pensando em assistir A mulher invisível. Pena que vou sozinha. Meu pai não tem tempo de ir comigo ao cinema, eu aprendi a gostar de assistir filmes só. E ir com ele e Lilian deve ser um saco. Eles são tão melosos.

Dando uma olhada pela internet, achei um Cd do Keane. O nome é Perfect Symmetry. Lançou ano passado. Tenho ouvido bastante. Mas nenhum dos cds se compara ao primeiro. Hopes and Fears é muito bom.

Eu voltei a ouvir. Sei que parece música de gente depressiva, mas eu gosto. Ponho os fones no ouvido, e marco pra repetir Bedshaped. Ouço mil vezes, choro, ouço, choro. Penso se não estou numa vibe emocore. Isso é ridículo. Odeio vibe emocore.


Domingo, 28 de junho de 2009

Então, o cinema foi legal. Eu assisti A Mulher Invisível. Selton Melo estava muito bom. A melhor cena foi ver ele beijando o nada. Foi muito engraçado.

Acho que minha vida fica um pouco parada demais quando estou de férias. Dá vontade de dormir todo tempo. Penso em quantas coisas escreveria aqui se estivesse estudando.


Terça-feira, 30 de junho de 2009

A ansiedade pra que chegue logo segunda-feira é terrível. Eu nunca pensei que ansiaria tanto a escola. Na verdade, meu anseio não é tanto a escola assim.

Eu sonhei com Felipe hoje. Foi um sonho estranho e sem lógica, mas eu pude vê-lo, o que é uma boa coisa.

Penso se não estou indo longe demais com isso. È provável que Felipe nem sonhe em saber o que eu sinto. Mas eu não consigo parar de pensar nele. Será porque é a única pessoa que tem me dado atenção em anos? Eu não sei. Ele sempre tão legal e atencioso e gosta de brincar comigo. Me faz rir. Até eu estranho o som do meu próprio riso. Preciso me acostumar com esse som.

Devo ir visitar minha avó no interior e passar uns dias com ela, até voltar às aulas.


Segunda-feira, 06 de julho de 2009

Enfim, volta às aulas! Nunca fiquei tão feliz de voltar das férias. O passeio ao interior foi bom, pude rever algumas pessoas, mas eu não fiquei totalmente confortável. Meus primos sempre comentavam que eu era quieta demais, muito reservada. Ninguém me entende muito bem. Nem eu.

E quando eu revi Felipe... Sei lá, ele parecia mais bonito hoje do que antes das férias. Não sei se porque já tinha um tempo que não nos víamos ou porque eu comecei a mentalizar a imagem dele e com o tempo a lembrança vai se apagando, mas quando ele sorriu, eu fiquei brilhando, disso eu tenho certeza. O melhor, ele disse que sentiu saudades. E pediu meu telefone. Isso é no mínimo notável. Mas eu me pergunto se isso vai ficar só na amizade. Por mim deve ficar, eu sou uma pessoa sem coragem.


Quinta-feira, 16 de julho de 2009

Parece que o relacionamento de meu pai e Lilian está chegando a outro nível. Bem, está de noite, e eu acho que vou dormir sozinha em casa. Ele não chegou ainda. Sei lá. Dá um medo. E eu não tenho nenhuma amiga pra me fazer companhia.

Pensei em ligar pra Felipe, pedir pra ele conversar comigo até eu pegar no sono, mas acho que é uma coisa muito esquisita a se fazer. Além disso, são dez da noite. Quem liga para um amigo dez da noite? Eu não vou fazer isso. Deve ter dois meses que eu o conheço. Ah, é tão difícil de explicar, mas eu me sinto tão próxima dele, em tão pouco tempo. A gente não conversa tanto porque eu não gosto muito de ficar falando sobre minha vida com ele. Mas tem momentos que eu sei que ele me entende. E é por isso que eu gosto dele.

Provavelmente se ela me ligasse e eu estivesse dormindo ou não estivesse afim de atender o telefone, quando ouvisse a voz dela eu não ia conseguir dormir o resto da noite. Não sei nem se eu ia conseguir falar alguma coisa.


Sexta-feira, 17 de julho de 2009

Consegui chamar Felipe pra ir comigo ao cinema. Foi algo parecido com “Felipe, você gosta de assistir filmes?” e ele “Sim. Por quê?” “Eu... queria... ver um filme...” Parei pra respirar e ver se ele tinha entendido a mensagem. Ele tinha uma cara de desentendido. “Quer ir ao cinema comigo?” “Ah, claro!” ele respondeu, meio surpreso.

Verdade que quase não falo nada, mas eu cumpri um objetivo, ainda que com dificuldade. Acho que vou deixar minha vida sempre assim: uma meta que eu vou me esforçar a cumprir. E o melhor, Felipe disse que vai comigo domingo, dia 25.

Quero assistir "17 outra vez". Parece legal. Mas qualquer coisa que eu assistir vai ser boa, mesmo sendo o prêmio framboesa do ano. A companhia já vale a pena. Não sei bem como me comportar,vou tentar ser natural.

Ah! Felipe me apresentou uma banda que eu já tinha ouvido falar, mas não conhecia muito bem: Oasis. Me emprestou um pen drive com algumas músicas. Comecei a ouvir, até agora é legal.


Segunda-feira, 20 de julho de 2009

Felipe me perguntou se podia levar uma amiga para o cinema no domingo. Eu não ia dizer não, isso é uma coisa óbvia. Mas, sendo uma amiga que ele quer levar pra o cinema, pode muito bem ser namorada dele. Quem é essa menina que ele nunca falou? E porque mesmo eu devo conviver com a presença dela? Eu detesto disputar atenção. Sinto que o cinema não vai ser muito bom pra mim no domingo. Não que eu quisesse transformar o filme numa situação romântica pra mim e pra ele, mas eu não vou conseguir me comunicar bem. Eu duvido que eu fale alguma coisa. Eu vou ser uma vela. Vela não, um candelabro.


Domingo, 25 de julho de 2009

Então, o cinema foi legal. Nós assistimos "17 outra vez", com Zac Efron. Ele tava tão bonitinho. A história do filme é bem legal, mas é um pouco previsível. Apesar disso, eu gostei. O personagem do Zac tem 37anos e está frustrado com a vida por que perdeu a oportunidade de fazer uma faculdade, essas coisas. Aí ele consegue rejuvenescer 20 anos e voltar à escola pra poder fazer novas escolhas. Foi legal.

Felipe foi mesmo com a amiga. O nome dela é Tatiana. Ela é linda. Tipo, muito bonitona mesmo. E eles ficam bem juntos. E eu fui uma grande vela de sétimo dia. Não, eles não se beijaram na minha frente. Na verdade, eles nem estavam de mãos dadas. Mas eu senti o clima no ar, totalmente. Tudo que ele falava ela sorria. É, eu sinto que devo desistir da vida.


Não consegui conter o riso ao ler essa parte. Não que eu fiquei feliz pela tristeza de Bárbara, mas porque eu e Tati somos quase irmãos. Ela é filha da minha madrinha, a gente cresceu junto.
Eu já estava gostando de Bárbara aí. Eu fiquei uma pilha quando ela me chamou pra ir ao cinema. E nem sabia o que fazer. Devo ter ficado muito aflito, porque Tati percebeu. Daí, ela disse que, se eu quisesse que ela me desse um apoio, ela ia. Eu nem precisei contar muita coisa pra ela. O engraçado foi Bárbara pensar que Tati podia ser minha namorada. Que coisa mais... nada a ver!


Terça-feira, 30 de junho de 2009

Às vezes eu tenho a impressão de que Felipe gosta de mim. Talvez eu seja um pouco pretensiosa ao pensar isso, mas eu penso. Talvez porque eu gosto dele. Sim, eu gosto dele, estou assumindo. Ele ainda é a única pessoa que faz questão de falar comigo naquela turma. Isso é um grande empurrão.

Eu gosto quando ele sorri e quando ele fala, das gracinhas que ele faz comigo e como discordamos às vezes. E eu não quero ficar falando sobre essa minha coisa platônica. Tá ficando cada vez mais difícil esconder. Sei lá, tem certos momentos que eu simplesmente fico encarando ele. Não sei como ele entende isso. Mas, tudo bem, eu nunca vou falar nada, isso vai morrer comigo.

Saber disso me deixou muito bobo uns instantes. Ela descobriu quase junto comigo que eu estava gostando dela. Ela era um gênio. E ver que ela pensava de mim exatamente o mesmo que eu pensava dela era muito extasiante. Eu fiquei em estado de choque por um momento. Se a gente tivesse dito isso um pra o outro antes as coisas seriam muito diferentes hoje.


Quinta-feira, 16 de julho de 2009

Eu estou um pouco triste esses tempos. Tenho visto meu pai muito pouco. Na verdade, costumávamos jantar sempre juntos quando ele chegava do trabalho e eu da escola. Era uma ocasião agradável, em que conversávamos sobre o que tinha acontecido no dia. Certo que eu nunca revelei muitas coisas sobre o meu dia, mas era a hora que ele tinha para saber como andavam meus estudos. E ele falava tudo, ou eu achava que falava. Nós sempre escolhíamos um filme bom pra assistir à noite e depois ele me colocava na cama. Eu acho que era a maneira dele de suprir a falta da minha mãe. Agora parece que eu sou órfã de mãe e pai. Ele nunca está em casa. Sei lá, é como se tivesse me esquecido. Ainda tenho medo da namorada dele. Nunca vou esquecer do que ela disse sobre o próprio filho.


Ler sobre Bárbara me fazia pensar nela escrevendo tudo isso. O que ela sentia e quando escrevia? Ela tinha tanta coisa guardada que eu nem sequer sonharia em saber.Cada página passada do diário me deixava mais misturado à Bárbara, mais e mais próximo dela. Então eu lembrei do seu sorriso tímido, da voz mansa, da maneira calma que ela tinha pra lidar com as coisas. Pensei em como as outras pessoas eram ignorantes por nunca se permitirem mergulhar no profundo poço que a formava, por nunca terem coragem de entrar no túnel escuro que levava ao paraíso do seu ser. Ela era o mistério e o mistério me fascinava. Saber que tudo isso podia desmoronar por um único ato violento de uma pessoa louca, me deixava irritado.

Eu comecei a pensar se essa história do sequestro não tinha ligação com a tal Lilian. Que eu me lembrasse, ela e o pai de Bárbara já não eram mais namorados havia mais ou menos dois meses. Mas Bárbara nunca tinha comentado sobre Lilian ser uma pessoa desagradável, possessiva, nada disso. Saber que ela era muito ciumenta me deixava com um pé atrás. Saber que Seu Paulo ficava pouco tempo em casa quando estava com ela era surpreendente. Ligar as duas coisas só me deixava pensar que essa Lilian tinha alguma ligação com a história. Mas, até aquele momento, a única coisa que me fazia crer que Bárbara podia mesmo ter sido raptada era a mensagem da página 200. Continuar a ler o diário era fundamental pra descobrir onde Bárbara poderia estar ou ao menos para ajudar a polícia. Como eu já tinha perdido o sono, o que me restava era continuar lendo.