Capítulo 18

Fiquei um bom tempo olhando Phil deitado naquela cama, cheio de medicamentos, induzido ao sono profundo. Não conseguia parar de me culpar. Em pensar que ele sempre foi tão saudável, gostava tanto de basquete, era um excelente jogador e estava ali, naquela situação, totalmente imobilizado, podendo nunca mais voltar a andar. Por minha causa ele tinha feito aquilo. Pra piorar minha situação, Ben também foi ao hospital.

Ele chegou com toda a família. A irmã dele, acho que se chama Claire, fez uma série de perguntas à enfermeira. Pra ela devia ser mesmo muito chato ir ao hospital visitr um desconhecido. Imagino como devia ser terrível também para o Ben visitar aquele que tinha passado tantos anos o maltratando. E aquela situação tinha a ver comigo.

- Olá Beatrice. - Ele disse, quando me viu no canto. Eu fiquei totalmente sem graça, principalmente depois do que aconteceu na formatura.
- Oi Ben - Respondi sem conseguir nem levantar os olhos para vê-lo.

O clima foi ficando cada vez mais tenso, mesmo por que a Senhora Stevenson não parava de chorar do lado de fora do quarto.

- Eu... Eu não entendo... - Ela falou. - O que fez ele ser tão imprudente? Ele não bebe, estava sozinho, não consigo entender. - Eu sabia bem o que tinha acontecido e não conseguia mais sentir raiva de Phil. Aquele quarto começou a ficar pequeno e sufocante de uma hora para outra, e eu fui ficando cada vez mais apertada. Precisava sair dali. Me despedi dos Smith e da mãe do Phil e fui embora.

Cheguei em casa chorando muito.

- As coisas estão mesmo tão terríveis assim querida? - Minha mãe perguntou. Ela esteve no hospital pela manhã, junto com meu pai, pra prestar condolências aos pais do Phil. Só que ela não soube do que eu fiquei sabendo mais tarde.
- Parece que Phil... - parei um tempo pra tentar respirar e dizer. - Parece que Phil não vai mais voltar a andar.
- Meu Deus. - minha mãe ficou digerindo o que eu disse. - Meu Deus.
- E a culpa é minha... - eu falei, desanimada.
- Filha, você não pode se culpar se ele saiu daqui dirigindo como um louco ontem. Você não mandou que ele fizesse aquilo. É uma questão de escolhas, se vocês não estavam mais dando certo juntos, não havia por que insistir. Ele só tinha que aceitar, não tentar se suicidar.
- Mas o problema é que... É que ele foi atrás de outro garoto ontem. Eu estou gostando de um outro garoto, por isso terminamos tudo. E Phil saiu daqui jurando que iria se vingar dele.
- Beatrice, querida, os pais do Phil vão tentar o melhor pra ele, pare de se preocupar com isso. A culpa não foi sua.

A semana foi passando e a minha tristeza só aumentava. Eu fui visitar o Phil mais algumas vezes, mas ele sempre estava dormindo. Pensei em procurar o Ben, só que eu sabia o quanto tinha sido burra, ia deixar que ele vivesse a vida.

Pelo menos eu não tinha magoado o Kevin também, então resolvi ligar pra ele.

- Oi Kevin. É a Beatrice.
- Oi. E aí, como está você? - Ele perguntou.
- Não muito bem, mas ainda estou viva.
- Notícias do Phil? - Ele perguntou.
- Parece que ele vai fazer um tratamento em Nova York, então não vou poder mais visitá-lo com tanta frequência. Espero que ele melhore.
- É. Então, o que tem feito?
- Nada de muito especial. Na verdade, estou passando mais tempo dentro do meu quarto do que pensei que passaria nessas férias.
- Acho que a idéia que te dei de conversar com o Ben na formatura não foi muito boa. Se eu não fizesse aquilo, talvez Phil não sofresse o acidente.
- Você também está se sentindo culpado? Kevin, você é quem tem menos culpa nisso tudo! É claro que a mais culpada sou eu. - Parei um tempo pra aceitar o que eu mesma disse - Mas... Você tem visto o Ben?
- Ben já foi pra Los Angeles. - Ele disse isso e eu senti que o que me puxava pra a cama me prendeu mais ainda.
- Ah, legal. - Eu não conseguia esconder o desânimo. - E você? Por acaso vai mudar de cidade também?
- Não por enquanto. Estou pensando em fazê-lo uma visita no fim das férias. Eu vou estudar lá, então, é bom ter um amigo que conhece a cidade.
- Que bom. Eu também vou pra lá, estudar. Espero que a gente se veja.

Conversar com Kevin era ter um pouquinho de Ben, mesmo que um pedaço pequeno. Eu me sentia um pouco melhor quando falava com ele. E ele parecia gostar de conversar comigo também, então eu não fiquei tão sozinha. Nos falávamos todos os dias e ficamos cada vez mais próximos. Foi assim que eu dei uma força pra que ele e Rebecca começassem a namorar.

- E aí Kev, como vão as coisas?
- Não tão ótimas. Bee, eu estou com um problema.
- Será que eu posso te ajudar em alguma coisa?
- Eu acho que estou gostando da Rebecca.
- E desde quando isso é um problema? - Kevin me surpreendia às vezes.
- Desde que ela não é uma professora!
- Como assim?
- Eu sempre fui um cara das paixões impossíveis, então, estou fora do meu normal. Se Ben estivesse aqui, ele faria uma festa de parabéns pra mim. - Ele falou em Ben e eu fiquei um bom tempo em silêncio - Oh, me desculpe Bee, eu às vezes esqueço que você não fica bem quando ouve o nome dele.
- Não, tudo bem, pode falar. Conte o resto.
- Ok. Eu não me lembro de ter gostado de alguém que não fosse uma professora. É, é isso.
- Mas, por que essa queda pelas professoras?
- Sei lá, talvez por que elas tem uma autoridade sobre mim. A mesma autoridade que Becky inspira.
- Becky? - Achei engraçado ele chamá-la pelo apelido. - Desde quando você acha que está gostando dela?
- Eu não sei explicar. Um dia eu olhei pra ela e as coisas ficaram diferentes. Parecia que meu dia tinha ficado mais legal. Então, eu sabia que era ela.
- Que coisa linda o que você disse! - Eu queria que Ben pudesse me dizer algo parecido agora. - Fala isso pra ela.
- Assim, do nada? "Oi Rebecca. Um dia eu te olhei e as coisas ficaram diferentes." Ela vai perguntar se eu fiquei maluco! - Eu comecei a rir. - Beatrice, pára de rir! É um momento difícil, sabia?
- É só você chamá-la pra sair, ir ao cinema talvez. Que eu saiba ela não está com ninguém agora. - Eu falei e ele suspirou do outro lado.
- Está bem, vou tentar. Se tudo der errado, eu te ligo depois.
- Não esquece de ligar se der certo também.

Kevin tomou coragem e chamou Rebecca pra sair. Daí por diante, eles mesmos começaram a se acertar, e não demoraram muito pra ficar juntos. Parecia que todo mundo conseguia ficar bem, menos eu. Rebecca também ficou muito próxima de mim, ela era uma garota legal. Bastante comunicativa e brincalhona, eu entendia por que Kevin estava feliz do lado dela.

Haviam passado duas semanas desde a formatura e eu continuava em casa. Phil estava em Nova York, Ben em Los Angeles, Kevin namorando com Rebecca, Anne também em nova York. Meus pais continuavam trabalhando e eu passava a maior parte do tempo sozinha em casa. Estavam sendo as férias mais deprimentes da minha vida. Então, eu resolvi procurar meus parentes. Eu precisava sair da cidade, ver outros lugares, visitar minha família. Resolvi viajar pra Tucson, no Arizona, onde minha avó morava e onde eu morei por um bom tempo. Minha mãe queria ir junto comigo visitar a mãe dela e conseguiu uma folga do trabalho para viajarmos. Meu pai não pode vir conosco, por que não teve folga da empresa. Ou pelo menos foi isso que ele disse.

Chegamos em Tucson na segunda-feira da terceira semana das minhas férias. Perto da minha avó moravam meu tio Peter e minha tia Gloria. Me lembrava que da última vez que estive em Tucson foi um ano depois de irmos para La Palma. Eu devia ter uns doze anos e a maioria dos meus primos tinha vindo passar um tempo aqui, como era de costume. Nossa família se reunia no natal e na passagem do ano, e depois os netos voltavam para as férias de verão. Minha avó Rose e meu avô Joe, pais do meu pai, também moravam em Tucson, então aproveitei para visitá-los.

Minha avó Mary era viúva já há uns seis anos, e morava com um dos meus primos, Larry. Larry perdeu os pais num acidente de carro, quando ele tinha só quatro anos. Minha avó ficou muito triste quando meu tio Charlie morreu e criou meu primo. Larry estava com vinte e dois anos e estudando na Universidade do Arizona.

- Beatrice? É você minha querida? - Minha avó perguntou quando me viu da porta. - Mas como está crescida! Pensei que nunca mais visitaria sua avó. E você Sue, por que demorou tanto tempo pra visitar sua velha mãe? Vocês precisam voltar a vir aqui todos os anos, como antes.
- Beatrice? Essa é aquela mesma Beatrice que veio aqui da última vez? - Larry falou. Pra mim ele também estava muito diferente, afinal, tinham se passado cinco anos que vim em Tucson da última vez. Eu gostava muito do Larry, ele sempre me levava pra dar umas voltas pela cidade.
- Larry! - Eu corri pra abraçá-lo. - Quanto tempo! Você está tão diferente!

Minha mãe ficou conversando um bom tempo com minha avó e eu fui visitar Tia Glória. Os filhos dela, Ashley e Thomas, estavam muito diferentes do que eu lembrava também. Quando eu tinha vindo aqui da última vez, Ashley tinha seis anos e Thomas tinha dez.
Tia Glória fez a deliciosa torta de maçã que eu tanto amava e eu passei uma tarde ótima com meus primos. Ela tinha se separado do marido, Tio George, e eu passei a maior vergonha perguntando se ele estava em casa. Isso que era ruim de ficar tanto tempo sem ver a família: você ficava totalmente desatualizada.

No dia seguinte, visitei meu tio Peter e sua esposa, tia Gina. A filha deles, Lauren, estava com quase catorze anos e mudara pouco desde a última vez que eu estive aqui. Pelo menos o rosto continuava o mesmo.

No terceiro dia eu fui à casa dos meus avós paternos, Rose e Joe. Meus avós tiveram três filhos, meu pai, Luke, meu tio Doug e minha tia Lucy. Minha avó perguntou por que meu pai não foi conosco, e meu avô se aborreceu por que ele não tinha tirado férias para visitá-los.

- Luke só pensa em trabalho e mais trabalho. Eu vou morrer e ele não vai ver meu enterro.
- Joe! - minha avó o repreendeu. Eu sabia que vovô Joe estava certo. Meu pai só pensava no trabalho.

Vovó Rose tinha uma estante com várias fotos da família. Na estante dela estava uma foto do meu pai e da minha mãe comigo e Anne, mais ou menos com seis e treze anos, numa das férias que passamos em Tucson. Ao lado dessa foto, estava uma foto do meu tio Doug com a esposa dele Patricia e os dois filhos, Sam e Bob, que era bem recente, por que meus tios foram na casa da minha avó no mesmo dia que eu estava lá e eu vi os garotos quase iguais à foto. Ainda tinham mais fotos, uma da minha tia Lucy com o marido Henry e a filha deles, Ellie, com uns sete anos, e outra foto minha abraçada a Ellie no balanço no jardim da casa. Uma foto na perede tinha todos os filhos e netos dos meus avós junto com eles. Um detalhe me chamou atenção: eu aparecia ao lado de Ellie nessa foto também.

Ellie era a prima que eu mais gostava. Ela era a única prima que tinha a mesma idade que eu, sendo mais velha só dois meses. Ellie era de outubro e eu de dezembro. Me lembrava que quando passava as férias em Tucson ela sempre estava comigo. Não nos pareciamos fisicamente, eu tinha herdado o cabelo ruivo da minha mãe e ela tinha o cabelo mais escuro. A única coisa que tínhamos igual eram os olhos castanhos da vovó Rose. Ela era bem humorada e engraçada, me lembrava bem disso.

- Vó, posso dar uma olhada no porão? - Perguntei.
- O que você vai fazer lá querida? Só tem um monte de coisas velhas e poeira. - Ela disse.
- Queria ver uma coisa.
- Joe, pode levá-la ao porão? - minha avó perguntou
- Sempre exploradora, não é Beatrice? - Sorri quando meu avô disse isso.

Fomos ao porão e eu fiquei lá procurando nas caixas um livro que eu tinha certeza de que tinha escondido por lá. Uma vez Ellie ganhara uma câmera de revelação instantânea. Ela saiu tirando um monte de fotos nossas passeando por Tucson, por que as férias estavam acabando e ela ia voltar pra Los Angeles. Nós fizemos um livro de recordações escrevendo nossos planos para o futuro e colamos todas as fotos que tiramos.

Eu só não sabia direito onde encontrar isso. O tempo foi passando e, quando estava pensando em desistir de procurar, encontrei uma caixa escrito "Coisas das meninas" com a letra da minha avó. Abri a caixa e achei algumas roupas que eu tinha esquecido por aqui em férias passadas, cds que Ellie trouxera para ouvir e esqueceu e o nosso livro de recordações. A primeira página começava com dois prefácios, um escrito por mim e outro por Ellie. O de Ellie dizia:

Quem estiver vendo isso aqui, espero que fique feliz. Foram férias legais que eu não quero esquecer. Por favor, tome cuidado por que eu vou me revoltar se esse negócio sumir.

Ellie

O meu prefácio era mais cheio de coisinhas floridas, muito menos decidido e direto que o dela.

Fui passando as páginas e vi nossos planos de morar juntas em Los Angeles, os nomes que queríamos colocar em nossos filhos e mais um monte de babozeiras de meninas de dez anos. As fotos eram a melhor coisa. Cada uma tinha um comentário escrito por ela e outro por mim. Em uma das fotos eu estava totalmente molhada e com uma cara de ódio terrível.

O comentário de Ellie dizia:

A melhor coisa que fiz nas férias: dar um banho na Beatrice.

O meu era uma resposta:

Melhor que isso, só o que eu fiz com você depois...

E na página seguinte tinha uma foto que minha avó tirou de mim e Ellie completamente sujas de lama. Me lembrava que eu voei em cima dela depois que ela me molhou e caímos na terra. Minha avó tomou a câmera para que não estragasse e tirou essa foto.

Ver aquelas coisas mexeu alguma coisa por dentro de mim. Ellie era a única prima que eu não tinha visto novamente. Essas foram as últimas férias que eu a vi. Depois disso, eu fiquei um tempo sem vir à Tucson e Ellie foi morar do outro lado do país, em Boston.

Voltei para a sala e encontrei meus avós assistindo TV. Já era noite, eu não tinha visto o tempo passar.

- Meu Deus, e agora pra voltar pra a casa da minha vó Mary? - perguntei, ficando nervosa.
- Nós já ligamos pra a sua mãe, ela disse que você pode dormir aqui hoje. - Meu avô respondeu.
- Mas eu não trouxe nenhuma roupa.
- No quarto da sua tia Lucy tem umas roupas dela que você pode usar, ficaram aí depois que ela casou. Eu sempre lavo algumas pra quando Doug e Patricia vêm aqui. Patricia sempre esquece de trazer algo pra passar a noite.
- Vó, depois que a tia Lucy se mudou pra Boston, a Ellie ainda vem aqui? - perguntei.
- Ellie não está com eles em Boston. Ela vem aqui sempre que pode - minha avó respondeu.
- Não está em Boston? E onde ela está morando?
- Desde o ano passado ela está em Los Angeles, na antiga casa. Me surpreende que você não saiba disso, vocês eram tão ligadas.
- Depois que ela foi pra Boston, perdemos contato.
- Podem se ver agora, já que ela está no mesmo estado que você.
- A senhora tem o telefone dela?
- Sim querida, vou procurar o número.

E eu ainda pensava que Ellie morava em Boston. Minha avó me conseguiu o telefone de Ellie. Era excelente que ela estivesse em Los Angeles. Eu podia visitá-la e, quem sabe, encontrar Ben por lá. Pensando nessa possibilidade deitada na cama da tia Lucy, caí no sono.

Comentários

  1. MEO DELSSSSSSSSSS

    qual das primas Ben vai escolher????????


    MOMENTOS DE TENSÃO


    ah sim, eu fiquei com o Kevin? '-' que fofeteeeeee

    eu inspiro autoridade? o.O sou brincalhona???? eu sou tão tímida... hehehehehe

    ah sim, avisa pro Kevin que eu posso aprender francês se ele quiser e que eu tb quero ser professora *-*

    aushuashuashuashuahsuahsuahsuahsuahsuahsuh

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