Capítulo 20

Eu acordei no dia seguinte e voltei à casa da minha avó Mary. Minha mãe já estava com as malas prontas pra voltar pra La Palma e eu me perguntava o que faríamos dali em diante. Agosto estava começando e no próximo mês eu deveria me mudar para algum alojamento em Los Angeles, pra começar a estudar. Eu nem sequer conhecia a cidade, então aquele era o momento de ligar para minha prima.

À noite chegamos em casa e eu aproveitei pra ligar para Ellie. Não sabia direito o que dizer, mas precisava falar com alguém que conhecesse bem Los Angeles.

- Alô? - A voz era bastante familiar. Parecia que eu tinha falado com ela recentemente.
- Ellie?
- Sim, quem é?
- Oi Ells! Aqui é Beatrice, sua prima. - Esperava que ela ainda lembrasse da minha existência.
- Beatrice? Como... Como você conseguiu meu número? - Ellie ficou surpresa com minha ligação.
- Eu estive Tucson essa semana e peguei seu número com a vovó.
- Sério? Mas que bom falar com você! Como está a vó Rose?
- Está bem. Eu fiquei um dia lá na casa dela e encontrei nosso livro de recordações.
- Mesmo? Mas que legal!
- Soube que você está morando em Los Angeles. Eu vou me mudar pra lá, ou aí, no outono, pode me mostrar a cidade?
- É o que mais tenho feito... - Ellie sorriu - Seus pais vem morar aqui?
- Não, eu vou estudar na Universidade do Estado da Califórnia, então preciso descobrir um alojamento, ou algo parecido, que seja mais em conta do que morar na escola.
- Ah sei. Se for por isso, não tem problema, você pode ficar aqui em casa. Quando você vem?
- Estou meio sem ter o que fazer agora nas férias. Pensei em te visitar, se não for um incômodo.
- Assim que você puder vir, venha. Vou ficar te esperando, só me ligar.
- Então, eu acho que vou no próximo fim de semana, pra conhecer a cidade, depois eu me acerto com você.
- Sábado pela manhã eu te encontro na rodoviária?
- É, se eu não for de carro, sim.
- Está bem então.
- Obrigada Ellie.
- Por nada Bee. Um beijo.

Então, eu já tinha destino e possível moradia em Los Angeles. Em dois dias eu estaria pelo menos na mesma cidade que Ben estava, podia encontrá-lo por lá, era só procurar. Talvez Ellie me ajudasse, talvez eles até se conhecessem. E se ela fosse a Ellie da banda que ele falou? Não ia ter nenhum grande contratempo, as coisas ficariam práticas e fáceis. Pela primeira vez em quase um mês de férias eu conseguia sentir a minha esperança reacender.

Me sentia tão bem que deu até vontade de passear. Saí com Kevin e Rebecca sem me irritar de ter um casal do meu lado, sem sequer pensar neles como um incômodo. Assistimos um filme na sexta à noite e cada dia que passava eu me sentia mais próxima de Ben.

- Pessoal, eu tenho uma notícia para vocês. Vou pra Los Angeles amanhã. - Eu disse, totalmente animada.
- Sério? Mas que coincidência! - Rebecca disse.
- Coincidência? - perguntei.
- É. Eu, Becky e Rachel vamos à Los Angeles para ver a banda de Ben se apresentar no festival na próxima semana. Acha que ainda está por lá? Podia vê-los conosco. - Kevin respondeu.
- O festival já é na próxima semana? - Fiquei surpresa em como o tempo tinha passado rápido, mesmo que ele parecesse se arrastar pra mim.
- Vai ser num sábado, acho que dia 14. Vamos pra lá mais cedo, pra conhecer a banda do Ben. - Kevin disse.
- Por que não vai junto com a gente na próxima semana? - Rebecca perguntou.
- Eu vou visitar uma prima que está morando lá, preciso ir antes. Talvez eu procure vocês pra vermos esse festival, se Ben não se importar por eu aparecer lá.
- Ele não vai se importar, eu acho. - Rebecca disse.

Eu e Kevin sabíamos que Ben provavelmente não ia ficar muito feliz com minha presença. E Kevin parecia saber de mais alguma coisa que eu não sabia. A cara que ele fez denunciou. Mas eu resolvi não perguntar. Poderia aproveitar essa semana que eu ia passar em Los Angeles pra fazer as pazes com o Ben. Se ele quisesse, eu estava disposta.

Sábado de manhã eu peguei o carro e fui para Los Angeles. Liguei para Ellie na sexta-feira, avisando que ela não ia precisar me buscar na rodoviária, só precisava me dar o endereço da casa e eu ia me achar. Ellie morava perto da UCLA, então eu tinha que descobrir ao certo onde ficava a universidade. Perguntando, com certeza eu ia chegar em algum lugar.

Antes de viajar, dei uma olhada no "Como chegar" do Google. Ele me deu três rotas diferentes pra chegar na UCLA, então eu sabia pelo menos como sair da minha rua até perto da casa da Ellie em 42 minutos com trânsito livre.

Eu saí de casa umas nove da manhã, peguei o carro e fui dirigindo pela La Palma Ave, contando com trânsito livre. O problema foi que a rota que eu escolhi passava pelo Aeroporto Municipal de Hawthorne, então eu fiquei num trânsito lento por quase meia hora, sem contar o congestionamento que eu peguei com as pessoas indo pra Santa Mônica. Minha viagem de 42 minutos se transformou em duas horas facilmente. Ainda bem que eu tinha feito uma seleção bem longa de músicas de viagem que não repetiu até que eu cheguei na UCLA. Liguei pra Ellie perguntando especificamente que ruas eu devia pegar pra chegar na casa dela. Me perdi algumas vezes e minha raiva maior foi descobrir que eu estava dirigindo em círculos.

Quando eu estava quase parando no meio da rua pra tentar encontrar a casa andando, vi uma casa com o número que Ellie me deu, na rua que ela indicou. No jardim da casa, um casal animado lavava dois carros, como é comum fazer num sábado pela manhã. Eles brincavam com a água, sorriam. O garoto estava de costas pra mim e garota veio correndo e se jogou em cima dele e lhe deu um beijo daqueles. Ela se virou para o carro e eu pude reconhecer: era minha prima, Ellie. Dei uma buzinada de leve, pra que ela olhasse pra mim. Ela se virou, eu saí do carro, levantei os óculos escuros e sorri pra ela. Ela pegou a mão do rapaz e foi puxando até mim.

- Até que enfim você chegou Beatrice! - Ela disse, sorrindo.

Eu olhei pra o namorado dela e vi exatamente quem eu não esperava: Ben. Minhas pernas começaram a tremer e meu sorriso sumiu.

- Ben? - Eu falei, piscando algumas vezes os olhos, pra ver se eu estava enxergando direito.
- Beatrice... - Ele disse, aparentemente tão confuso quanto eu. - O que você...? - Ele ficou mudo.
- Vocês se conhecem? - Ellie perguntou a Ben. Tanto eu como ele ficamos em silêncio. Afinal, não tinha o que dizer naquela situação. - Meu Deus... É ela? É ela a Beatrice que você falou? - Ellie começava a desesperar tanto quanto eu já estava.

Voltei, abri a porta e me sentei no carona do carro. O rádio do carro estava tocando A matter of feeling. Lágrimas começaram a surgir.

Just a matter of feeling this moments madness sure to pass. And tears will dry as you're leaving who knows you might find something to last

Eu não tinha que estar ali. Agora a reação de Kevin na sexta tinha feito sentido. Ele sabia que Ben estava com alguém. Pior, esse alguém era minha prima e tinha sido minha melhor amiga.

How does it feel as time too heavy to hold? Whatever you desire for the moment is holy whenever you slow down to see life is passing by. Steal away in the morning love's alredy history to you...


* Mãe e pessoas que estão lendo que não sabem muito de inglês ou não querem parar para procurar a tradução na net. Os trechos acima dizem, em português: Primeiro trecho - "E as lágrimas secarão enquanto você parte; Quem sabe, você pode achar algo que dure" ; Segundo trecho - "Como é a sensação? O tempo é pesado demais para segurar? O que quer que você decida no momento é sagrado sempre que você desacelera para ver a vida passar. Saia sorrateiramente de manhã, o amor já é passado para você..." - Fim do capítulo.

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