Capítulo 22

E então eu cheguei no hotel tarde mais uma vez. Só que dessa vez, minha mãe não disse nada. Eu sempre ficava apreensivo quando ela não dizia nada, por que eu sabia que vinha alguma coisa depois do silêncio. E o que vinha a seguir, nunca era bom.

Resolvi relaxar e dormir, afinal amanhã seria o último dia desse passeio, então eu não devia me preocupar. E quando acordei na manhã seguinte, minha mãe Claire estava sentadas vendo TV.

- Não vão dar uma volta hoje? - Perguntei, esfregando os olhos.
- Estávamos esperando você acordar pra nos levar onde você vai todos os dias - minha mãe respondeu. - Ah, e uma tal "Ellie" - ela fez aspas com os dedos - ligou hoje de manhã. Quem é? - Eu não suportava quando minha mãe dava esses ataques controladores. Respondi o que ela queria ouvir, e não deixava de ser verdade.
- Minha namorada. - Então ela começou a falar um monte de coisas que eu não prestei muita atenção enquanto me ajeitava para sair. - Olha, só vou sair daqui mais tarde, se Claire quiser ficar um pouco na piscina do hotel... - Minha mãe parou de fazer seu discurso e respondeu.
- Você nem sequer estava me ouvindo, não é? Está bem, vamos à piscina. Mas, se eu voltar pra o quarto e você não estiver aqui, saiba que você só volta à Los Angeles quando as aulas começarem, está entendendo? - Eu assenti em resposta

Dei uma ligada para o Kevin antes de sair. Precisava saber como estavam as coisas, e falar um pouco sobre como eu estava esses dias.

- E aí Kev, como você está?
- Estou bem, e você?
- Estou passeando, ensaiando, conhecendo a cidade...
- Tenho conversado bastante com Beatrice esses tempos - tinha que tocar nesse assunto? - Ela está bem triste com tudo isso que está acontecendo, mas me ajudou bastante esses tempos.
- Te ajudou? Com o que?
- Por causa dela, eu estou namorando com Rebecca agora
- Sério? Rebecca Collins, do baile? Não acredito. Você está bem?
- Sim, estou muito bem, obrigado. Eu disse a Bee que você faria uma festa quando soubesse disso. - "Bee"... Ouvir Kevin chamar Beatrice assim doía nos meus ouvidos.
- Ah, legal... Não me lembro da última vez que você não se interessou por uma professora - eu sorri
- Mas você não sabe de nada. Rebecca quer ser professora de francês. - Kevin disse isso eu eu caí no riso. - Então, e você e a Ellie?
- Estamos juntos.
- Juntos?
- Oficialmente, desde ontem. Você precisa conhecê-la, ela é... não sei nem descrever.
- Wow! Já está assim? E Beatrice?
- Por favor Kevin, eu não quero lembrar disso.
- Tudo bem, mas eu acho que você devia pensar. Já pensou se vocês se reencontram e você está namorando Ellie? Quem você vai querer? - Eu não estava pensando nisso, nem queria pensar.
- Eu não quero pensar nisso agora. Então, no segundo sábado de agosto vai ser o festival. Nós estamos sem baixista, mas acho que daqui até lá podemos nos resolver. Você vem nos assistir?
- Seria uma boa, mas eu não tenho onde ficar.
- Vou falar com Ellie. Se tiver uma vaga, você pode vir com sua namorada.
- O problema é que se Becky for, Rachel tem que ir também, se não os pais delas não deixam, entendeu?
- Tudo bem, eu falo com Ellie.

Terminei minha conversa com Kevin e disse a minha mãe que estava indo ensaiar. Liguei pra Ellie, que reclamou do meu atraso, afinal já eram quase onze da manhã. Avisei a Dan que precisava levar minha mãe na casa dele e ele topou, não tinha escolha mesmo. Cheguei na garagem de Dan com toda minha família nas costas, ou quase isso.

- Pessoal, essa é minha mãe Elizabeth e essa é minha irmã Claire. - apresentei-as quando chegamos.
- A que quebrou a guitarra? - Dan perguntou sobre Claire, obviamente preocupado com todos aqueles instrumentos.
- Calma, ela não vai fazer isso agora, ela já tem 12 anos - Minha mãe defendeu
- Sim, ela tinha 10 quando fez isso. - respondi
- Gente, eu estou aqui... - Claire falou
- Mãe, essa é Ellie, o que ficou com medo dos intrumentos é Dan, o que estava afinando o baixo quando chegamos é Josh.
- É um prazer Senhora Smith. - Ellie disse
- É mesmo, prazer em conhecê-la. - Dan falou - desculpa pela minha reação com os instrumentos, mas...
- Sim, eu sei, a imagem da Claire não é muito boa, não é? - Minha mãe disse e Dan deu um sorriso sem graça.
- Seja bem vinda Senhora Smith, a casa não é minha, mas, se quiser ouvir o som...
- Vou levá-la pra conhecer minha mãe, ela está mesmo esperando sua visita.
- Muito obrigada... Dan?
- Sim senhora.
- Não precisam me chamar de Senhora Smith, podem chamar de Elizabeth, ou Liz, eu não me importo. - Minha mãe parou e olhou pra Ellie. - Bom gosto do meu filho... Foi um prazer conhecê-los, principalmente você Ellie.
- Ah... Obrigada Senho... digo, Liz. - Ellie respondeu

A minha cara deve ter caído no chão com esse último comentário da minha mãe. Ela ficou na casa, conversando um pouco com a mãe de Dan. Claire deu uma olhada nos instrumentos e se sentou no canto.

- Então, você é a irmãzinha dele? - Ellie perguntou
- Sim, infelizmente.
- Infelizmete? Por que? Eu o acho um ótimo rapaz. - Ellie sorriu e piscou pra mim.
- Claro que você acha ele ótimo, vocês estão namorando, não é? - Claire disse e Ellie deu um riso de canto.
- Eu não sei...
- Ah, não vem com essa, eu vejo as coisas! - Ellie riu quando Claire falou isso
- Ok... Eu não sei bem como lidar com irmãs mais novas por que eu sou filha única, mas nós somos as únicas meninas aqui, então podemos conversar um pouco.
- Sempre é bom. O que você toca? - Claire perguntou a Ellie
- Bateria.
- Uau! Mas que legal! Nunca conheci uma garota que tocasse bateria...
- Parece que elas estão se dando bem. - Josh observou e comentou comigo.
- É bom que ela se dê bem com alguém. - Por que pra mim Claire era anti social
- Então, vocês estão mesmo juntos? - Dan perguntou
- Estamos decidindo. Na verdade, Ellie está decidindo.
- Você é rápido no gatilho. Te invejo cara - Josh falou e eu sorri, por que isso era mesmo engraçado.
- Por que demorou tanto pra chegar, Ben?. Uns dez caras já passaram por aqui, fizeram suas audições... - Dan disse.
- Perdi algum grande gênio? - perguntei
- Não, ninguém foi muito bom - Josh disse. - Estamos esperando os outros quinze que disseram que vêm agora à tarde.
- Quinze? - pensei que era uma boa quantidade, afinal, nem minha mãe, nem Claire iriam querer ficar aqui tanto tempo ouvindo baixistas desconhecidos.

E foi exatamente como eu pensei. Minha mãe pediu que eu a levasse ao hotel para "um intervalo de almoço". No carro, ela foi comentando suas impressões sobre meus amigos.

- Claro que eu não os conheço como conheço o Kevin, mas eles parecem bons garotos. São bem educados, e a mãe do Dan me disse que você se comporta muito bem lá. Gostei de saber. Ela te elogiou bastante.
- Ah, legal.
- Os garotos são legais, mas eu gostei da Ellie. - Claire disse
- Sim, sua namorada, Ellie. Ela é uma menina educada e bonita também. Quando vai levá-la à La Palma pra seu pai conhecê-la?
- Mãe, não penso em fazer isso tão cedo. - Do jeito que as coisas eram por lá, iam acabar dizendo que Ellie era minha noiva.
- Mas, por quê?
- Está cedo demais pra isso. Vocês não vêm aqui pra ver o festival? Então, ele vai conhecer a Ellie.

Minha mãe não ficou muito satisfeita com minha resposta. Eu mesmo não sabia se não levava Ellie à La Palma por isso ou por causa de Beatrice. Eu nem pensava em voltar a La Palma tão cedo.

Quando eu disse que iríamos audicionar quinze pessoas no baixo hoje à tarde, minha mãe preferiu ficar no hotel.

- Tudo bem, já conheci seus amigos, são bons meninos, agora me dá um tempo. Não vou ficar lá ouvindo um monte de estranhos tocando.
- Ok, estou voltando pra lá. Qualquer coisa, me liga.

Voltei pra o nosso "estúdio" e vi uma fila formada na frente da casa de Dan. Muito mais do que quinze baixistas esperavam sua vez de tocar, e eu agradeci a Deus por não ter que passar por isso pra tocar com o pessoal.

- Pessoal, o Ben chegou, e aí, podemos começar as audições? - Dan perguntou
- Por mim, ok - Josh respondeu
- Pra mim também - Ellie disse.

Dan se levantou e se dirigiu à enorme fila.

- Vamos começar as audições, ok? Por favor, número um, chegue à frente.

Nós estávamos sentados parecendo os jurados do American Idol, esperando que aqueles jovens, talentos ou não, mostrasse o que tinham de melhor. Primeiro entrou uma garota baixnha, com um cabelo punk.

- Diga seu nome, por favor. - Dan falou com ela
- Amanda Kennedy - a garota respondeu
- Então Amanda, toque pra a gente.

Tinha que adimitir, foi melhor do que eu esperava. Mas só era a primeira, tínhamos muitas outras pessoas pra ouvir.

- Valeu Amanda, você arrebenta. - Josh disse - Se eu não te ligar, me liga, certo?
- Ah, pára com isso Josh! Amanda, você foi muito bem, se for a melhor de todos ligamos pra você - Ellie disse
- Obrigada - Amanda respondeu, pôs o baixo na capa e foi embora.

Os concorrentes seguintes não foram tão bons quanto Amanda. Já estavamos pensando em chamá-la de volta, quando um cara alto, de cabelo preto, chegou. Ele era o número vinte e dois, ou algo próximo disso.

- Diz aí, qual o seu nome? - Dan, que estava coordenando a audição, perguntou.
- Noah. Noah Brooks. - Ele respondeu, com uma voz grave.
- Noah? Nome bíblico. Bem exótico. - Ellie disse
- Então Noah, pode mostrar pra a gente o que você sabe fazer? - Josh perguntou.

Eu senti que ele ia arrebentar. Não sei se era por que ele estava bem quieto na fila, pessoas quietas normalmente são excelentes instrumentistas. E o baixo precisava de concentração, ele parecia bem concentrado.

- Vou começar com o que eu acho mais fácil, pode ser? - Ele perguntou.
- Faça como quiser Noah. - Eu disse

Noah começou tocando o solo de introdução de Billie Jean, que um monte dos caras que tinham passado por lá tocou.

- Está bem Noah, passa do fácil pra o difícil, a gente já ouviu muito isso hoje. - Dan falou. Noah sorriu.
- Ok, ok, vou pra alguma coisa que eu gosto mais. Vocês conhecem Jaco Pastorius? - Noah perguntou
- Eu conheço, muito bom. - Eu disse. Jaco Pastorius era um excelente baixista.
- Vou tocar "Come on, come over", é fácil também, mas é bem legal - Dava pra ver que o cara tinha cultura.

Ele ficou tocando e foi um pouco repetitivo. Ele percebeu.

- Está bem, vou tentar o difícil. Qual de vocês toca guitarra? - Noah perguntou.
- Eu toco - respondi.
- Sabe Maxwell Murder do Rancid?
- Sei. - Falei. Rancid era uma banda punk e essa música tinha um solo bem legal no baixo.
- Pode me acompanhar?

Noah puxou o solo da música e eu fui com ele na guitarra. Foi muito legal, muito legal mesmo, por que eu achava o solo do baixo difícil, e ficava tentando me concentrar na guitarra e no baixo ao mesmo tempo.

- Você demorou muito pra tirar isso? - Eu perguntei.
- Mais de uma semana cara, é muito rápida. - Noah respondeu.
- É fantástica! - Ellie disse
- Você toca mais alguma coisa? - Josh, nosso baixista exigente que seria substituído, perguntou.
- Ah cara, ele foi muito bem, não é? - Dan disse
- Não, tudo bem, eu posso tocar um não tão difícil e outro tecnicamente difícil. - Noah respondeu.

Noah tocou a introdução de "Journey To The End Of East Bay" do Rancid, que era bem legal, e depois tocou "School days" na versão de Stanley Clark. Ou seja, ele era bem versátil, tocava de jazz à punk. Dessa vez, fui eu que dei a resposta.

- Noah, eu achei que você tem muito talento. E, pra mim, foi o mellhor que ouvimos, então, espera que eu acho que vamos te ligar.
- Talvez Ben esteja sendo precipitado Noah. - Josh disse - Mas eu gostei de ouvir você tocar.
- Obrigado pessoal, eu vou esperar vocês ligarem. Foi um prazer conhecer vocês. - Noah se despediu e foi embora.

Pelo menos eu sabia que Noah tinha muito potencial. Nós ouvimos a outra dezena de baixistas que se apresentaram depois mas, nenhum era tão versátil como ele. Então, na pequena reunião que fizemos depois da audição, unanimemente escolhemos Noah para ser o nosso novo baixista.

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