Capítulo 24 - O esperado ponto de vista de Ellie

Eu sabia que Ben era um bom garoto. Ele era inteligente, tocava bem, tinha futuro. Eu tinha o conhecido havia mais ou menos um mês e nunca esperei tanto a volta de alguém como eu esperava a dele.

Eu tinha me juntado com uns amigos de escola pra montar uma banda: Josh Anderson e Dan Philips. Josh, que tocava guitarra, era um garoto alto, de cabelo loiro e olhos claros, que se achava, mas era legal. Dan, do teclado, era mais ou menos do tamanho de Josh, tinha o cabelo preto, olhos azuis e era mais tímido, apesar de ser muito exigente. Eu era uma espécie de novidade pra eles, "a garota que tocava bateria".

Eles estudavam na mesma sala que eu só que nós não nos falávamos, até eles descobrirem que eu tocava bateria. Dan e Josh eram muito amigos e eu sempre andava com uma garota chamada Sophie. Eu tinha acabado de voltar de Boston, estava morando sem meus pais, pra mim a escola era como nova; Sophie foi a única garota que foi legal e quis andar comigo. Ela era meio nerd e pegava muito no meu pé. Um dia, reclamando comigo, claro, ela disse:

- Desse jeito você vai parar de estudar pra viver tocando bateria!

Esse foi o pontapé inicial pra que milhares de pessoas descobrissem o talento que eu estava a fim de esconder, pelo menos por um tempo. Josh e Dan foram umas dessas pessoas. Eles tinham algumas coisas em comum comigo, como gostar de séries de TV e ficar prestando atenção nas trilhas sonoras tanto das séries como dos filmes. Além disso, eles também tocavam, e Josh queria montar uma banda, como The Kooks, coisa de colégio mesmo. Eu topei. Por isso Sophie parou de andar comigo.

Josh escrevia umas músicas legais, podíamos ensaiar na garagem de Dan e eu fui ficando cada vez mais próxima deles. Eles se conheciam desde pequenos, faziam natação juntos, eu acabava ficando um pouco de fora às vezes.

Costumávamos ensaiar sempre depois da escola, era o momento de mostrar nossa evolução. Cheguei ao ponto de levar minha bateria pra a garagem de Dan, pra não ter que montá-la e desmontá-la sempre.

O chato era que nós ficávamos só naquela de garagem, nunca tomávamos coragem de sair pra tocar por aí. Foi passando o tempo, Josh resolveu parar de tocar guitarra e começou a tocar baixo. Eu achei meio estranha essa mudança repentina, mas era uma escolha dele, quem era eu pra dizer alguma coisa? E ele era bom o suficente pra tocar os dois quando quisesse.

Então Josh decidiu que iríamos procurar um novo guitarrista, só não disse como faríamos isso. Por outro lado, eu resolvi nos inscrever para um festival que ia acontecer no meio do ano, o que significava que tínhamos tempo bastante pra treinar e encontrar um novo cara pra a guitarra.

Um dia, num domingo, os garotos tiveram uma competição de natação de manhã e à tarde marcamos pra ensaiar. Eu estava meio preocupada com quem ficaria na guitarra, e resolvi ir na casa de Dan, mesmo que não costumássemos ensaiar domingo. Foi aí que conheci o Ben.

Eu fui chegando na garagem e ouvi alguém tocar Dream on do Aerosmith, tão perfeito que eu pensei que era um CD. Só que o Steven Tyler nunca começava a cantar. Eu vi um garoto diferente sentado, tocando na garagem, e pela forma que ele tocava imaginei que fosse o novo guitarrista. Fiquei parada na entrada esperando ele terminar de tocar, pra comentar depois.

- Bom esse cara que vocês acharam - Eu disse
- Oi Ellie - Os garotos responderam
- E aí? - Falei, esperando que eles dissessem quem era aquele cara tocando. ele virou pra mim e eu pensei "Humm, toca bem e ainda é bonito..."
- Ellie, esse é o Ben, um amigo da natação. Toca bem ele, não é? - Dan disse.
- Oi Ben. - Suspendi os óculos pra enxergar melhor o rosto dele.
- Oi - ele pigarreou - Oi Ellie. É um prazer conhecê-la. Dan e Josh falaram de você.
- Humm, legal. E aí, vai ficar tocando com a gente? - perguntei. Um cara gênio que nem aquele tinha que ficar, pra que a gente ganhasse o festival.
- Ben não mora aqui Ellie. - Josh disse.
- Onde você mora Ben? – Perguntei. Talvez ele morasse em algum lugar por perto
- La Palma - ele respondeu
- Não é assim tão longe. – como imaginei - Por que não ensaia com a gente por um tempo e depois você volta?
- Eu ainda estou estudando.
- Você está no último ano, certo Ben? - Ele devia ter a mesma idade que a gente, no máximo dezoito.
- Sim
- Por que não estuda aqui em Los Angeles? - Pensei um pouco - Se bem que o tempo de mandar as recomendações já passou...
- Mas eu mandei cartas para a UCLA também. Minha mãe me forçou a mandar cartas para o maior número de universidades possível. Então, estou esperando minha admissão ou recusa, quem sabe. - Bom saber. Se eu fosse aprovada e ele também, podíamos nos ver mais vezes.
- Que dia você vai embora? - Ele deveria estar passando um tempo por aqui...
- Hoje
- O quê? Mas, por quê? - perguntei automaticamente
- Eu vim pra uma competição de natação que só ia durar o fim de semana. Já fiz as duas provas e hoje, no fim da tarde, estou voltando pra casa.
- Você não pode ficar só uma semana? – perguntei
- Meus pais ficariam preocupados e, além disso, eu não tenho onde ficar.
- Pode ficar na minha casa.

Talvez fosse um tanto precipitado da minha parte convidá-lo pra ficar na minha casa, mas, se ele viesse mesmo estudar aqui, podia ficar lá permanentemente, como os estudantes que moravam na república. Conversamos bastante nesse dia, e ele me contou sobre como tinha se parado aqui. Assim como os garotos tinham descoberto por acaso que eu tocava bateria, também descobriram por acaso que Ben tocava.

Perguntei a Ben se ele ia ligar para os pais, pra ficar uma semana a mais aqui e sugeri que ele pedisse a um amigo para anotar o que ele perdesse nas aulas da semana. Não sei como, mas ele conseguiu convencer fácil demais à mãe de que ia ficar uma semana aqui. Foi assustador. Acabou que ele passou a semana lá em casa, com todo mundo lá.

Enquanto estudávamos, Ben ficava em casa, fazendo o que ninguém queria fazer, como cozinhar e limpar. De tarde sempre íamos ensaiar na garagem, e eu comecei a me interessar por Ben. Passávamos muito tempo juntos por que depois dos ensaios sempre revisávamos minhas aulas. Um dia, no ensaio, estava tentando criar um solo legal de bateria e o celular de Ben não parava de tocar. Tentei me concentrar, mas foi impossível. Atendi o telefone, não tentando ser intrometida, mas por que achei que não seria uma coisa muito terrível.

Era uma garota. Fiquei pensando se não era namorada dele. Ela disse que era uma amiga, deixou recado, mas a nossa conversa foi curta. Na verdade, ela disse "Bem, não necessariamente uma amiga..." isso queria dizer que tinha alguma coisa ali. Alguém ligou à noite e Ben ficou todo estranho. Eu e Josh não sabíamos por que ele estava reagindo daquela forma e perguntamos se tinha acontecido alguma coisa.

- O que foi cara? Alguém morreu? – Josh perguntou
- Não, foi uma amiga que ligou. – Ben respondeu, totalmente sem cor.
- E você fica assim? - Josh disse
- Ah, sim, me desculpe Ben. Esqueci o recado – Eu falei. Pela reação dele, imaginei que fosse a mesma pessoa. Então, resolvi dar o recado, antes que fosse tarde.
- Que recado? – Ele perguntou.
- Uma garota, Beatrice, te ligou hoje de tarde, quando você foi comer alguma coisa. Eu estava tentando me concentrar no solo de uma música e o celular estava me atrapalhando, então eu atendi. Me desculpe. Ela pediu pra você ligar de volta. Foi a mesma garota? - Perguntei
- Mas, por que você atendeu meu telefone? – Ele tinha se irritado.
- Eu já pedi desculpas. Estava mesmo me incomodando. Não fiz por mal, da próxima vez vou sair da garagem. - Se eu tivesse feito pra atrapalhar as chances dele.
- Qual é cara? Essa Beatrice é sua namorada? – Josh perguntou. Fiquei quieta, pra ver o que ele ia responder.
- Não. - ele disse
- E por que ficou tão nervoso? – Josh perguntou de novo.
- É por que, é estranho, ela nunca me ligou. - Foi ele dizer isso, eu entendi tudo.
- Oh, sei, típico caso de amor não correspondido. – Josh disse e nós rimos.
- Desculpa, tá? Não quis destruir suas chances com a garota. – falei.
- Não se preocupe. Me desculpe por ser tão grosseiro. Eu e Beatrice não temos nada.
- Humm, sei, talvez por que ela não quer. – Pela reação dele, se a garota quisesse alguma coisa...
- Não, ela tem namorado. Eu não sou e nem quero ser a segunda opção pra ela.

Eu fingi que acreditei no que ele disse. Estava na cara que ele gostava muito dela. Eu fiquei um pouco sem graça com ele depois disso. Então, ele me pediu desculpas no outro dia e eu o levei pra conhecer as universidades da cidade, como ele disse pra a mãe que faria durante essa semana.

Eu estava gostando muito daquela semana com Ben e como ele ia embora no domingo, dei um jeito de deixar isso claro. No sábado, depois do ensaio, conversamos um pouco.

- Você sabe que minha rotina mudou completamente depois que você chegou aqui, não sabe? – perguntei
- Imaginei isso. – ele disse – Visitas sempre alteram as rotinas. – Ele sorriu e eu também.
- Já que você vai embora amanhã, vou te mostrar aonde eu vou para tirar o estresse no fim de semana. - Eu falei
- Onde vamos? - Ele perguntou
- Um lugar que você deve se sentir em casa.
- Não faço ideia.
- Vou te levar pra o mar, peixinho.

Chegamos em casa, comemos uma pizza e depois fomos até Santa Mônica.

- Já que você nada, vou te ensinar a subir numa prancha. – falei quando chegamos à praia. – Aqui não é o Havaí, mas dá pra você aprender alguma coisa.
- Mas você só tem uma prancha. Então eu fico ali sentado observando enquanto você surfa.
- Eu tenho uns amigos que alugam pranchas. Não pense que vai escapar de mim assim tão fácil.
- Oh cara, eu não confio tanto assim em mim.
- Já que não confia em você, confie na sua instrutora, a melhor surfista da Califórnia. - Ok, eu tinha sido bem convencida, mas não dá pra confiar em quem não confia em si mesmo.

Alugamos a prancha e fomos para a água. Eu falei a ele o que fazer e fui.

- É só isso. – eu disse – Agora, me olha e aprende.

Só que quando eu disse "me olha" era pra ele prestar atenção no que eu estava fazendo, não ficar me observando. eu precisava dar um basta, mesmo que fosse brincando.

- Ben, pára de olhar pra minha bunda. Estou ficando com vergonha. – Claro que ele não estava olhando mesmo. Ou talvez estivesse. Ele pareceu entender o que eu quis dizer.

Eu peguei uma onda daquelas, bem inspiradora. Depois mergulhei e subi bem do lado dele.

- Sua vez – eu falei
- O quê? - Ele talvez não estava esperando que eu o chamasse assim tão rápido
- Eu vou com você. - tentei deixá-lo mais seguro

Foi muito engraçado ver Ben tentar surfar. Eu não conseguia segurar o riso. Mas teve uma hora que ele conseguiu se concentrar mais e ficou em pé na prancha um tempo maior. Peguei a onda junto com ele. Depois ele mergulhou e surgiu do meu lado.

- Fui bem? - ele perguntou, parecendo criança pequena
- Achei que demorou muito pra aprender. - eu brinquei
- Sério? - e ele acreditou!
- Não – eu sorri – Um dos melhores alunos que eu já tive. – Ele sorriu também.
- Está bem Ellie. Eu finjo que acredito.
- É sério!

Aí o sol começou a se pôr e eu vi que tínhamos passado praticamente a tarde toda na praia.

- É, acho que está na hora de ir pra casa – Ben falou.
- Espera um minuto. Vamos ver o sol e a gente vai. - eu gostava tanto de ver o sol.
- Está bem.

Nos sentamos na areia e eu me encostei no ombro dele pra ver o sol se pôr. Bem ficou todo estranho com isso.

- O que foi Ben? Ninguém nunca encostou no seu ombro? – Perguntei. Às vezes ele era um pouco estranho. Depois que eu disse isso ele relaxou um pouco e começou a passar a mão no meu cabelo. A sensação era tão relaxante! Ele parou de olhar o sol e ficou me encarando. Quando me virei, ele me beijou.

Eu realmente não esperava aquilo. Não do mesmo garoto que tinha ficado em choque quando uma menina ligou. Mas eu não o empurrei, nem sequer repeli o beijo, mesmo por que eu estava gostando daquilo. Na verdade, eu estava gostando dele.

Fiquei um bom tempo quieta na volta pra casa. Eu não sabia bem o que dizer depois do que aconteceu, mas o silêncio estava ficando incomodo.

- Então Ben, você vai embora amanhã, essa foi a nossa despedida? – Perguntei quando estava quase parando o carro.
- Eu ainda vou voltar. Ainda tem o festival – ele respondeu
- Certo – Eu disse, pensando se tinha feito a coisa certa. Eu precisava saber se gostava mesmo dele, não podia ficar achando que gostava.
- Ellie – ele falou quando eu parei – Eu sei que eu fui um pouco precipitado, me desculpe. - Desculpar?
- Não tem o que desculpar Ben, não foi nada demais. - Pra mim tinha sido legal.

Ele ficou me olhando um tempo. Ele tinha uns olhos tão lindos, mesmo no escuro dava pra notar. Ben parecia tão confuso quanto eu. Então ele me beijou de novo. E foi mesmo muito bom. Mas eu não podia esquecer da reação dele ao telefonema no outro dia.

- Vou sentir saudades – Disse apenas isso e me afastei dele
- Eu vou voltar. - Ele falou
- Vamos, você precisa arrumar suas coisas. – Eu abri a porta e saí do carro – E não tem por que se preocupar, isso não precisa ser uma coisa séria. – Eu disse, tentando me convencer de que era aquilo que eu pensava.

Só tinha uma semana que eu o conhecia, mas ele era extremamente cativante. Durante a semana que ele tinha passado na minha casa, eu não parava de pensar nele. Foi assim que saindo da escola uma manhã, dei uma passada numa loja e comprei um óculos que achei que ficaria bom nele. Era minha maneira de fazê-lo lembrar de mim: o óculos era igual ao vermelho que eu usei no dia que o conheci.

Então, domingo pela manhã fui deixá-lo na rodoviária, sem saber direito quando ele voltaria. Antes dele subir no ônibus, dei meu presente.

- Tenho uma coisa pra você. – Eu disse – Espero que goste e use. – E sorri. Não conseguia parar de sorrir perto dele
- Obrigado. – Ele disse, segurando meu rosto e me dando um beijo.

Dan e Josh ficaram surpresos com isso. Eles me perguntaram depois. E agora eu estava aqui, esperando ansiosamente Ben voltar.

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