O LIVRO de Bárbara #03

Parei por uns instantes de ler o livro. Me senti invadindo a privacidade dela. Mas, desde quando isso se tornaria invasão de privacidade se o conteúdo foi endereçado a mim? Minha preocupação era: com que objetivo alguém me mandaria aquele diário?

Talvez a própria Bárbara quisesse que eu lesse aquilo. Então, porque não me entregou pessoalmente? Comecei a folhear desesperadamente o diário, à procura de alguma coisa que indicasse qual o objetivo de me enviar aquilo. Virei o livro de cabeça pra baixo e nenhum bilhete caiu. Me lembrei do embrulho. Corri até a estante, abri o embrulho e dentro dele não havia nada. Então, liguei para Bárbara. Reconheci a voz do pai dela do outro lado da linha.

- Oi Seu Paulo! Por favor, posso falar com Bárbara um instante?
- Ela não está em casa.
- Será que ela vai demorar? Diz pra ela, por favor, que me ligue quando chegar. É Felipe.
- Felipe? Mas, ela deveria estar na sua casa!
- Na minha casa? - Olhei o relógio. Eram quase oito da noite. Bárbara não costumava ficar tanto tempo fora. - Ela não está aqui...
- Como não? - Comecei a me preocupar.
- Talvez ela resolveu ir ao shopping, não é? Vamos esperar pra ver. Vou tentar ligar pra o celular dela.

Alguma coisa muito estranha estava acontecendo. Liguei pra ela. chamando... ... ... ... ... ... ... "Caixa postal, deixe seu recado após o sinal..." Dificilmente Bárbara não atendia meus telefonemas. O que poderia estar acontecendo?

Olhei o livro em cima da escrivaninha em meu quarto. Parecia magnético. Naquele momento, era minha maneira de permanecer ao lado dela. Me sentei na cama e retomei a leitura.

Sexta-feira, 12 de junho de 2009

Péssima idéia a minha de fazer um Orkut. Descobri dois tópicos sobre mim na comunidade da escola. Um se chama “Porque Bárbara não fala com ninguém? Ela é psicopata?” e o outro “Felipe e Bárbara: quem acha que não tem futuro levanta a mão \o/” Foi deprimente. Quem eles pensam que são pra ficar comentando sobre a minha vida sem a minha permissão? Pior, eu não sei se devo me resignar a isso. Me pergunto se Felipe sabe. E, se sabe, será que se importa?Esse feriado tem sido péssimo. Meu pai decidiu ir à
praia no domingo. Quer me apresentar a namorada dele.

Domingo, 14 de junho de 2009

Então, hoje eu conheci a namorada do meu pai. O nome dela é Lílian. Ela é bem legal. Queria saber como foi que eles se conheceram.
Lílian tem um filho de dez anos, o nome dele é João Lucas. Ele também foi à praia. Meio mimado. Mas a gente lida bem com essas coisas.
Que bom que hoje é domingo. Passei os quatro dias do feriado pensando na segunda-feira. Estou querendo assistir A mulher invisível. Talvez eu possa não ir sozinha dessa vez. Será que chamar meu único amigo é uma coisa estranha? Não sei muito bem como me comportar com as pessoas.


Voltei a me perguntar qual seria meu real objetivo de ler aquele livro e quem tinha me mandado aquilo. Então, observei uma parte grifada no dia 12 de junho: “ir à”. Tinha também alguma coisa escrita no fim da página do dia 15: pág. 200. "IR À PÁGINA 200". Uma mensagem? Curioso, fui contando página por página até achar o número. Nem li a história direito, procurei uma nova pista. No canto, escrita à lápis, achei a seguinte mensagem:
"S OI OL LO, SA QU AST LO, MA EJ U DA"
Não era muito lógico. Lembrava latim. Retornei à leitura da data onde tinha parado.

Segunda-feira, 15 de junho de 2009

Então chegou a esperada segunda-feira. E com ela veio um Felipe bronzeado e feliz pelo excelente feriado. Eu queria poder curtir assim os feriados.
Felipe disse que eu também peguei um bronze. Na verdade, ele falou que eu voltei pra escola com uma "pegada de surfista". Onde ele achou essa pegada, só Deus sabe. Eu realmente não consigo enxergar nada disso no espelho.
Felipe me ensinou uma coisa legal: criptografar mensagens. Foi bastante interessante por que pudemos conversar quase duas aulas, sem ninguém conseguir ler o que estava escrito. Ele chamou de anagrama.
O nosso funciona quando colocamos nossos nomes, um sobre o outro, cortamos as letras repetidas e fazemos a transposição das letras equivalentes em outras palavras. Virou um código. Me senti uma pessoa mais inteligente depois disso.
Ah! Tomei coragem de chamar Felipe para o cinema. Bem, isso não significa que eu já realizei, mas que eu devo fazer isso ainda essa semana.


Parei pra pensar na história desse dia. E na frase da página 200.

Rabisquei meu nome e o de Bárbara num pedaço de papel. Cortando as letras repetidas e colocando as iniciais do sobrenome de Bárbara, nossos nomes tinham o mesmo número de letras: Barcq e Felip. Então, um "B" equivalia a um"F", um "A" a um "E", e assim sucessivamente. Risquei a frase e comecei a trocar as letras. Então "S OI OL LO, SA QU AST LO, MA EJ U DA" se tornou "S OC OR RO, SE QU EST RO, ME AJ U DE".

"Socorro, sequestro, me ajude". Seria uma mensagem de Bárbara pra mim? Eu devia levar a sério? E se alguma coisa ruim estivesse mesmo acontecendo com ela? E se ela estivesse contando com a minha ajuda? Liguei novamente para o celular. Desligado. Liguei pra a casa dela.

- Seu Paulo, Bárbara já deu notícias?
- Ela me ligou agora pouco e disse que estava na casa da tia, foi fazer uma visita e demorou muito lá. Deve voltar na segunda.
- Certo então.
- Conseguiu falar com ela?
- Não.
- Se bem que ela disse que o celular estava descarregado.
- Tudo bem. Obrigado.

Eu ainda não conseguia acreditar. Para não assustar o pai dela, resolvi continuar sozinho a leitura do livro e ver o que ainda podia descobrir disso. Bárbara devia ter pedido para deixar o embrulho na minha casa porque não queria preocupar o pai. Ela sabia que eu ia ficar curioso. Ela sentia que eu poderia ajudá-la. E eu precisava fazer isso. Como? Aquele diário devia ter mais alguma coisa escondida.

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