O LIVRO de Bárbara #08

Quarta-feira, 09 de setembro de 2009

Felipe me deu um presente. Eu trouxe o chaveiro da torre pra ele, mas isso não significava que ele tinha a obrigação de me dar um presente. Pra ser mais específica, é um chaveiro também. Só que o dele é diferente, daqueles chaveiros de letras. Ele disse que a proposta é meio gay, mas que eu não devo encarar assim. Só tem duas letras: BF. Eu perguntei por que e ele disse que era o jeito que melhores amigos se tratam hoje em dia, que ele já tinha dado um chaveiro daqueles à Tati e que isso significava “Best Friend”. Legal. O “B” é cor de rosa, o “F’ é azul. É bonitinho e já está na penca de chaves da minha casa.

Às vezes eu penso que eu me apego demais às coisas pequenas que Felipe faz. Mas eu achei mesmo isso muito bonito. A gente não tem tanto tempo que se conhece, mas ele já é uma pessoa importante no meu dia-a-dia. O problema é que eu não acredito que isso vá a algum lugar.

P.S: Se bem que, antes dele me explicar, imaginei que essas letras poderiam ser as iniciais dos nossos nomes. Esperança é mesmo uma coisa boba...


Se Bárbara soubesse o real significado daquelas letras ela não ia achar que ficava por ali. Eu gostei muito do presente que ela me deu, era uma prova de que ela se lembrava de mim. Então, pensei em retribuir de alguma forma. Eu vi um desses caras que faz chaveiros de letras e pedi pra ele colocar no chaveiro as iniciais dos nossos nomes. Mas, como eu sou covarde pra dizer a verdade a ela, inventei essa história do Best Friend. Ainda achei que ela poderia entender minha mensagem subliminar. Pior, ela entendeu e não quis acreditar.


Sexta-feira, 11 de setembro de 2009

É incrível como os eventos que acontecem nos Estados Unidos são sempre lembrados. Hoje é aniversário do atentado às torres gêmeas, e claro que as redes de TV não iam deixar de reviver esse momento que está fazendo oito anos. Mas, realmente, é uma falta de tempo. Eu me recusei a ligar a televisão. O mais interessante é que as coisas que acontecem aqui não são lembradas com tanta frequência.

Agora, parece que antigas catástrofes atraem novas catástrofes. Peguei o resultado da minha primeira prova de química do segundo semestre e descobri que fui péssima. Pra piorar, Felipe quebrou o pé jogando bola, está de atestado médico e não veio pra a escola. E eu pude relembrar os tempos que eu era uma pessoa excluída da turma. Bem num dia de atividade em dupla. Pra que melhor?

A hora mais tensa foi quando todos os bons colegas escolheram suas duplas e não sobrou ninguém pra trabalhar comigo, a não ser aqueles que ninguém quer trabalhar por que não gostam de fazer nada. Aí eu me peguei sorteando com qual deles eu ia fazer a atividade. Um dia de reprises.



Sábado, 12 de setembro de 2009

Hoje foi o aniversário de Lilian e meu pai resolveu fazer um coquetel elegante aqui em casa. Ele me fez ir ao salão de beleza, me comprou roupa nova e queria que eu fosse anfitriã da festa junto com eles dois. No fim das contas, eu acabei ficando de garçonete pra a imensa quantidade de amigos do meu pai da namorada dele, depois fui animadora da parte infantil da festa, o que incluía o filho de Lilian, Lucas, e mais um monte de guris mimados como ele e por último me tranquei no quarto em imensa decepção.

Ainda me surgiu uma menina, filha de um dos amigos lá do meu pai, chamada Juliana pra me falar de Crepúsculo. Nada contra quem gosta, mas eu acho que esse negócio de febre não é a minha. A menina era um saco e deve ter me achado chata por que eu meramente assisti o filme, achei a ideia de vampiros brilharem no sol uma idiotice e ainda disse pra ela. Bom, foi uma maneira de afastá-la.

Pra eles deve ter sido tudo ótimo. Pra mim foi um horror. Quero saber quantas vezes isso vai se repetir na minha vida. Se continuar assim, eu vou morar com minha avó.


Segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Felipe voltou à escola, com tala no pé e canetas pra o pessoal assinar o gesso. Na hora que eu cheguei, uma quantidade imensa de meninas se aglomerava pra tentar deixar alguma mensagem pra ele. Até gente de outras salas. Eu simplesmente coloquei minha mochila na cadeira ao lado da dele, me sentei, e fiquei olhando aquela cena patética. Ele me olhou e perguntou, na cara mais dissimulada do mundo, se eu não queria assinar também. “Não, obrigada. Não sou dada a costumes tribais” eu respondi. A cara dele foi ótima. As meninas devem ter me achado ridícula. Eu nem me importo. Eu queria assinar, mas o que eu queria mais era ler o que aquelas imbecis tinham escrito.

O professor chegou e ainda foi difícil expulsar aquelas meninas. Felipe deve ter achado aquilo o máximo, ele não parava de sorrir. No fim das aulas, ele praticamente me coagiu a escrever alguma coisa. Eu li algumas coisas em voz alta, como “Fê, me liga. Tâmara, sala ao lado” e o número dela, ou “Te acho um gato. Melhoras. Carol” de uma menina da minha sala. Eu não podia deixar passar a oportunidade de fazer gozação da cara dele. Então eu escrevi meu nome e BFF. Eu escrevi pensando em “Bárbara e Felipe Forever” mas, quando ele perguntou, eu disse que descobri isso na internet e que era a continuação do chaveiro que ele me deu. Ele sorriu e deixou que uma das idiotas empurrasse sua cadeira de rodas até a saída. Eu poderia fazer isso, mas já basta.

Meu pai viajou a negócios e eu vou dormir sozinha em casa. Na verdade, não tão só porque a moça que trabalha aqui está no quarto ao lado, mas eu me sinto só. Lilian perguntou se eu não queria dormir na casa dela. Eu recusei, ainda que achasse uma atitude nobre da parte dela. Eu prefiro a minha casa.


Eu lembrava desse dia. Aí eu já estava percebendo que ela era terrível, mas gostava dela ainda assim. Eu tinha passado o fim de semana em casa, com dores no pé, à base de analgésicos e estava morrendo de saudade dela. Quando eu cheguei à escola na segunda-feira, algumas meninas da sala pediram pra assinar meu gesso.

- Tudo bem – eu respondi – Todo mundo faz isso.

Uns meninos que eram mais próximos de mim, aqueles que eu jogava bola depois das aulas, também assinaram. Apesar de passar muito tempo com Bárbara, eu ainda fazia amigos. Um deles, chamado Pedro, comentou quando Bárbara chegou:

- Agora sim, chegou quem você realmente quer que assine. Vai lá, garanhão.
- Cala a boca imbecil. – eu respondi. Tinha um monte de meninas ainda querendo escrever alguma coisa e eu já estava ficando incomodado. Tinha meninas que eu nunca tinha visto.
- Até vou me retirar pra não estragar o momento de vocês. – Ele disse e eu fiz uma cara feia.

Ela cumprimentou as pessoas, séria, colocou a mochila na cadeira ao lado da minha e se sentou.

- O que é isso? – Ela perguntou, com uma cara engraçada.
- Estão assinando meu gesso. Por que não assina também? Se você demorar muito vai ficar sem espaço.
- Não, obrigada. Não sou dada a costumes tribais. – Ela disse isso e eu devo ter ficado com a cara no chão. Que gênio terrível. Ela aproveitou o momento pra esculhambar tanto a mim como às meninas que estavam ali. E eu não podia negar que aquela era mesmo uma atitude idiota, mas era legal. E o que tinha demais nela assinar meu gesso?
- Bárbara, deixa de ser assim! Que horror! Eu aqui, doente, cheio de dores e você ainda me trata desse jeito? – ela sorriu – É sério! Você podia aprender um pouco com essas meninas.
- Tá bom – ela respondeu e continuou olhando pra o gesso.
- E você só responde isso?
- Sim.
- É por isso que eu me revolto com você.
- Tudo bem. – ela sorriu de novo. Bárbara parecia se divertir com as meninas tentando se organizar pra escrever alguma coisa naquele pedaço de gesso.
- Bárbara... – Eu chamei pra ver se ela voltava à atenção pra mim.
- Sim...
- Assina? – Ela sorriu outra vez, o sorriso sarcástico que ela sempre dava.
- O professor chegou. – Ela disse, e se virou pra a frente da sala, como se a aula já fosse começar.

Nós ainda perdemos alguns minutos tentando colocar as meninas pra fora da sala, pra convencê-las de que ainda tinha o intervalo e que eu ia ficar de tala por mais um tempo. O intervalo foi a mesma agonia e Bárbara teve a mesma atitude, de só observar. Eu senti que ela devia querer que eu insistisse. E eu não fui pirracento, eu pedi pra ela escrever alguma coisa, eu insisti.

Então, ela sorriu, pegou a caneta e começou a escrever, primeiro B, depois F e aí eu soube que ela tinha entendido o chaveiro. Depois ela colocou outro F e eu fiquei confuso.
- BFF? – Perguntei
- Sim, Best Friends Forever.
- Ah, tá... – Minha esperança foi por água abaixo e eu vi que ela estava fazendo o mesmo jogo que eu.
- Não é assim que as pessoas se chamam por aí?
- Sim, na internet.
- Então pronto.
- Estamos na moda.
- Talvez.
- Sim.
- Pode ser.
- Por que você sempre dá essas respostas curtas?
- Não sei. – Ela sorriu

Eu me revoltava com essas reações de Bárbara. Mas ela sempre acompanhava essas pirraças com um sorriso encantador, eu ficava muito entregue. Essas e outras coisas fizeram com que eu me apaixonasse por Bárbara. Era por isso que eu não podia permitir que alguém tirasse a vida dela. Mas parecia que quanto mais eu me aprofundava nesse diário, mais tudo parecia uma despedida, meu momento de conhecê-la depois de sua morte. E algumas questões permaneciam em minha mente. Se Lilian tivesse mesmo sequestrado Bárbara, porque estava escondendo isso, porque não avisava ao pai dela, se era mesmo uma questão de chantagem? Se não fosse Lilian, quem poderia ter sequestrado Bárbara? Teria alguma relação com as notas frias que ela encontrou no computador do pai? Se sim, será que o pai dela sabia do sequestro e estava escondendo do resto das pessoas, tentando resolver sozinho o problema que ele mesmo criou? Eu não tinha outra pista a seguir a não ser o diário.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Escrevendo na Copa do Mundo - Edição Extraordinária!!!

Crônicas do solteiro moderno - #01 O cara que escrevia errado

Mendigo Virtual PGM #05