O LIVRO de Bárbara #10

Comecei a imaginar mil maneiras de falar com essa tal Carolina, prima de Bárbara. Passavam de duas da manhã, me deu fome. Eu tinha que descer as escadas na ponta dos pés pra que ninguém me ouvisse.

Se minha mãe sonhasse que eu estava acordado até essa hora de um sábado pra ler o diário de... uma amiga, digamos assim, e que isso envolvia um possível sequestro no qual eu estava me metendo e tentando resolver sozinho... Ela iria me trancar no quarto. Para sempre. Não, ela iria me internar e queimar o diário. Quelquer coisa que me deixasse longe do que ela logicamente consideraria uma falta de senso. Sem imaginar que eu estou tentando salvar a garota que eu amo.

Como eu faria isso? Não tinha a mínima ideia. Uma coisa era certa: só poderia procurar a polícia se tivesse provas concretas. Um diário talvez não fosse a prova mais concreta pra eles. Ainda mais com coisas envolvendo o governo. Um detetive particular? Eu não tinha mais do que dez reais na caixa dentro da minha gaveta. Perguntar ao pai dela? Não se ele estava metido nisso. Falar com Tati? Talvez.

Abri devagar a porta do quarto, passei pelo corredor sem nem respirar direito e fui descendo a escada na ponta dos pés.

- Felipe? - A voz da minha mãe. Droga - É você? - Respirei fundo. Se ela insistisse, eu devia responder, pra que ela não acordasse meu pai. - Quem está aí?
- Sou eu mãe. - sussurrei
- Por que não está dormindo Felipe?
- Só vou beber água. - Droga de fome idiota. Poderia muito bem ter ficado no quarto se o estômago não estivesse incomodando.
- E porque a luz do quarto estava acesa?
- Eu esqueci, acabei dormindo.
- Humm...

Já que ela sabia que eu estava com a luz acesa havia um tempo e não tinha ido perguntar nada antes, talvez não tivesse problema continuar acordado. Comi alguma coisa e voltei para o quarto.

Me joguei na cama, abri novamente o diário e vi o nome dela escrito outra vez. Ah, Bárbara, Bárbara, por que você tinha que fazer isso comigo? Voltei à página marcada.

Sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Cada dia que passa eu me convenço mais de que Felipe é a pessoa a quem eu deveria falar as coisas. Ele sempre se mostra tão prestativo e inteligente, sei que ele poderia me ajudar a entender o que está acontecendo. Cada dia eu fico com mais medo. Falta pouco menos de um mês pra que fiquemos de férias, eu não sei o que devo fazer.

Segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Estou começando a contar os dias pra o fim das aulas. Não que eu esteja ansiosa por isso, mas o tempo que tenho com Felipe é curto. Cada tarde é preciosa. E eu sei que ficaremos um tempo sem nos ver. Parece que meu pai quer sair da cidade outra vez. Não faço ideia de pra onde vamos.

Terça-feira, 1º de dezembro de 2009

Estava pensando, se eu pudesse dizer a Felipe tudo o que sinto em relação a ele, o que eu diria? Que fico pensando nele o fim de semana todo? Que sou a única pessoa no mundo que fica alegre em plena segunda-feira? Sim, talvez. Eu nem sei explicar o que acontece comigo direito. Mas só de olhar pra ele, alguma coisa mexe por aqui. Às vezes eu só queria que ele deixasse de existir, pra que minha cabeça parasse de rodar tanto quando ele aparece.

Quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Vi outra vez o carro. Talvez eles estejam estudando meus hábitos, pra saber como devem agir. Dessa vez, disfarcei e anotei a placa. Se amanhã o mesmo carro aparecer, já tenho como saber que é ele. O homem que dirige o carro é alto, barbado, está sempre de terno, usa óculos escuros e tem um sinal na bochecha, perto do olho. Ele tem um jeito estranho.

Sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

O homem do carro é da empresa do meu pai. Sei disso por dois motivos. No vidro do carro dele tem o mesmo emblema que o carro do meu pai tinha quando ele trabalhava na construtora, um capacete e uma régua num adesivo no canto esquerdo. E eu me lembro dele numa das festas da empresa.

Lembro dele, da esposa e do filho, acho que ele era um dos seguranças. O nome dele é que eu não consigo lembrar bem. Na verdade, não consigo lembrar.


Então era isso. O homem que estava sempre parado na porta da escola era segurança da empresa. Mas eu não conseguia lembrar de jeito nenhum o nome da empresa que o pai de Bárbara, Paulo, trabalhava. Por essas e outras coisas que eu devia ser mais atento.

Sábado, 5 de dezembro de 2009

Meu pai acabou de me comunicar que vou passar as férias inteiras com a minha avó Zélia. Eu gostaria de visitar minha avó Marisa, mãe da minha mãe, se ele deixar. Não que eu não goste de ficar na casa da minha avó Zélia. Eu tenho primos legais do lado paterno da família, mas alguns são velhos demais pra passar as férias com ela e meu avô. Minha avó Marisa faz um doce de leite maravilhoso. E, se eu for lá, posso contar à Carolina minhas novas descobertas a respeito do Caso Lago. Talvez ela me ajude a descobrir porque estou sendo vigiada.

Segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Hoje, ouvi novamente conversas noturnas do meu pai no telefone. Um homem, de voz grave, disse "Vamos manter a vigilância da sua filha, Dr. Paulo. Por enquanto ela está segura, não tem nenhum tipo de ameaça, pelo menos no período que ela está na escola. Mas, entenda o seguinte, a Correia e Castro é uma empresa maior, eles têm jeito a dar. Sua saída aparente não passou despercebida por eles, tenha certeza. Se quiser mesmo manter a segurança, se mude, é o que aconselho."

Então, o homem que me segue não é meu possível sequestrador. Isso significa que posso me manter mais tranquila. Ao que parece, meu pai ainda mantém contato com a Lago, mas por uma questão de segurança. Então, ele não foi para uma empresa menor. Ele mentiu pra mim. Ainda sinto que algo pior está por vir.


A história ficava cada vez mais enrolada na minha cabeça. Se a empresa do pai dela, Lago, agora eu sabia o nome, não tinha a ver com o sequestro, quem poderia ter feito isso à Bárbara? E com que objetivo? Será que o pai dela sabia mesmo do que estava acontecendo?

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