As voltas que o mundo dá - Capítulo 9

André tinha conseguido resolver sua vida, mas João Pedro continuava enrolado. Ele sabia o que sentia, mas não sabia o que dizer.

Pensando em oportunidades, resolveu fazer uma festa em casa. Convidou o pessoal da turma pra um churrasco no feriado de 15 de novembro. Caía numa terça-feira, todo mundo já estaria descansado do fim de semana prolongado e ainda poderia comer e tomar banho de piscina no fim da folga.

Aquela era a oportunidade perfeita pra duas coisas: dar um jeito de apresentar Carol ao irmão mais velho e, claro, ver Carol de biquíni.

João Pedro ficou planejando essa festa por quase dois meses. Coisas como tomar coragem de falar com os pais, juntar uma graninha e chamar todo mundo de forma que as pessoas aceitassem ir eram coisas difíceis de fazer, ora.

Antes disso, João tinha perdido uma valiosa oportunidade num passeio no shopping. Ele tinha marcado com alguns amigos de dar uma volta e quem sabe assistir um filme e convidou Carol pra ir também. Acabou que, por ironia do destino, ninguém foi, só eles dois.

Pra João foi uma excelente ironia. Em compensação, ele não soube retribuir o destino por isso. Só foi uma tarde agradável no shopping, como se faria com qualquer outro amigo, mesmo que sua língua estivesse coçando. Em outra oportunidade ele ainda faria isso.

Então, no feriado ele acordou cedo e começou a organizar as coisas pra fazer o tal churrasco. Ele não sabia fazer churrasco, ia contar com o auxílio do irmão. Pediu pra a mãe fazer uma saladinha, mas ela não se contentou e fez várias outras coisas, como esses salgadinhos de tira-gosto e doces, com a justificativa de que "vai que algum deles não come carne, não é?"

O pessoal foi chegando aos poucos. João Pedro não estava tão se importando com quem chegava, só ficava meio apreensivo cada vez que a campainha tocava. Ele sempre esperava que fosse Carol, mas, parecendo que de pirraça, ficava mais tarde e nada dela chegar. O horário combinado foi 14:00. Teve gente que chegou em cima da hora, teve gente que chegou um pouco depois, toda hora alguém entrava, veio gente até da outra turma. Mas nada de Carol.

Nesse momento João já estava um pouco desanimado, mantendo uma conversa comum com os meninos da turma. Alguns estavam tomando banho de piscina, outros jogando videogame, outros só batendo um papo mesmo, assim como ele. A maioria das meninas estava ou na água ou tomando sol na beira da piscina.

Então, três e meia da tarde, Carol chegou. Ela estava com uma blusa branca simples, de malha, com o biquíni por dentro, um shortinho jeans e usando havaianas azuis com desenhos de flores. Tudo bem que a roupa dela era quase igual a de todas as outras meninas, mas ela parecia tão mais bonita...

Ela veio caminhando em direção à mesa que ele estava. A mesa só tinha meninos, mas ela se aproximou assim mesmo. Foi falando com todo mundo até que chegou nele.

- Ai João, desculpa meu atraso. Fiquei esperando meu pai poder me trazer aqui. E, sabe, feriado, ele ficou meio com preguiça.
- Tudo bem...
- Ainda bem que eu não cheguei depois das quatro...
- É, pelo menos ainda tem sol. - Então ele foi lentamente se apartando da conversa com os outros rapazes.
- Acho que vou aproveitar pra cair na piscina.
- É uma boa.
- Você vai também?
- Não, não, a piscina fica aí todo dia, a gente acaba enjoando, não é? - Esse foi o pretexto que ele usou pra não tirar a camisa na frente de todo mundo. João odiava ser magro e nesses momentos era uma coisa muito mais incômoda.
- Mas que besta você. - Ela sorriu. - Vou deixar minha bolsa em cima da mesa.
- Posso ser legal e colocar os pés dentro da água pra te dar um apoio moral...
- Humm, tá...

Ela tirou a roupa e pulou na piscina. Não tinha graciosidade nenhuma. Foi tipo aquele pulo infantil conhecido como "bomba", que molha qualquer um que está na borda. Mas ainda assim pareceu pra João Pedro que as coisas estavam em câmera lenta. Ele ficou todo molhado também, como as pessoas ao redor da piscina que reclamaram. Ele só sorriu.

Ela nadou um pouquinho de um lado pro outro e ele só admirando. Então os outros meninos chegaram de surpresa e o empurraram de roupa e tudo dentro da piscina. Ele tomou um susto e um caldo terríveis. Quando conseguiu se levantar, todo mundo estava dando risada. No mesmo momento surgiu um ódio tremendo, o que fez ele praguejar todos em voz alta.

- Calma, João, foi só brincadeira. - Carol falou, se controlando pra não rir.
- É, brincadeira idiota. - Ele respondeu, ainda irritado, enquanto saía da piscina. Pensou em trocar de roupa, mas desistiu. Eles poderiam fazer isso de novo.

Sentou numa cadeira perto da piscina e continuou admirando Carol. Alguém ligou o rádio pra criar um clima ambiente. Todo mundo ao redor ria e brincava, conversava bastante e parecia estar se divertindo.

"Quer saber quando te olhei na piscina se apoiando com as mãos na borda..." uma musiquinha desconhecida tocava suave no fundo, vinda do rádio. "E os pés que irão por esse caminho vão terminar no altar... Eu só queria me casar com alguém igual a você" e a música começou a fazer tanto sentido... "O meu coração é o teu lar! E de que que adianta tanta mobília se você não está comigo?"

"Na cor do esmalte que você vai escolher só para as unhas pintar. Quando é que você vai sacar que o vão que fazem suas mãos é só porque você não está comigo? Só é possível te amar..." Então ele olhou e lá estavam as unhas vermelhas naquelas mãos brancas e delicadas. E solitárias também.


Ele saiu dali quase imediatamente, com a desculpa de que ia trocar de roupa. Ele realmente subiu pra trocar de roupa, mas aproveitou pra procurar a letra da música na internet e ouvir mais uma vez. Parecia tanto com a situação lá embaixo. Ele desceu e voltou a se sentar na mesa onde estava antes. Dessa vez Carol, que já tinha saído da piscina, estava tomando sol com as outras meninas, enquanto ainda tinha sol.

O resto da tarde passou num instante, porque quando a gente passa tempo com quem a gente gosta as horas voam.

À noite ele resolveu escrever um e-mail pra ela. Na verdade, só mandar a letra da música, porque a letra bastava. Já dizia tudo o que ele queria dizer e não tinha coragem.

"Oi. Hoje, durante o churrasco, ouvi uma música que me fez lembrar você. Veja a letra.

Quer saber quando te olhei na piscina
Se apoiando com as mãos na borda
Fervendo a água que não era tão fria
E um azulejo se partiu porque a porta
Do nosso amor estava se abrindo
E os pés que irão por esse caminho
Vão terminar no altar
Eu só queria me casar
Com alguém igual a você
E alguém igual não há de ter
Então quero mudar de lugar
Eu quero estar no lugar
Da sala pra te receber
Na cor do esmalte que você vai escolher
Só para as unhas pintar
Quando é que você vai sacar
Que o vão que fazem suas mãos
É só porque você não está comigo
Só é possível te amar...
Seus pés se espalham em fivelas e sandália
E o chão se abre por dois sorrisos
Virão guiando o seu corpo que é praia
De um escândalo, charme macio
Que o cor terá se derreter?
Que som os lábios vão morder?
Vem me ensinar a falar
Vem me ensinar ter você
Na minha boca agora mora o teu nome
É a vista que os meus olhos querem ter
Sem precisar procurar
Nem descansar e adormecer
Não quero acreditar que vou gastar desse modo a vida
Olhar pro céu só ver janela e cortina
No meu coração fiz um lar
O meu coração é o teu lar
E de que que adianta tanta mobília
Se você não está comigo
Só é possível te amar
Ouve os sinos, amor
Só é possível te amar
Escorre aos litros, o amor



João Pedro"


Ele sabia que aquele e-mail traria implicações posteriores. Perguntas como "O que você quis dizer com isso?", entre outras, que ele com certeza teria problemas pra responder. Mas, e daí? Como dizia a música, de que adiantava tanta mobília se ela não estava com ele? O máximo que ele poderia ouvir era um não, de novo. Ele não tinha nada mais a perder.

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